O presente texto é um breve resumo histórico e argumentativo sobre a filosofia da liberdade. Nele, buscamos acompanhar como esse conceito foi pensado e repensado ao longo do tempo, desde a Antiguidade até as discussões contemporâneas. A liberdade aparece aqui como um tema central da experiência humana, sempre desafiado por teorias que a defendem, a limitam ou mesmo a negam. Ao longo da exposição, diferentes visões entram em confronto: de um lado, a tradição compatibilista, que procura conciliar liberdade e determinismo; de outro, a visão incompatibilista, que entende tais ideias como mutuamente excludentes. O objetivo não é esgotar o tema, mas iluminar o debate e destacar como essa questão continua atual, atravessando filosofia, ética, ciência e até mesmo a vida cotidiana. Espera-se que este texto sirva como um pequeno guia de estudo. Caso o leitor deseje aprofundar-se em algum ponto específico, encontrará aqui referências bibliográficas que podem orientar novas leituras e reflexões. Introdução A teoria da liberdade tem sido um tema de debate filosófico desde a Antiguidade, atravessando diferentes períodos históricos e se desafiando constantemente com questões sobre o determinismo e a responsabilidade moral. Desde Aristóteles e Sêneca, que abordaram a liberdade como a capacidade de agir de acordo com a razão e controlar as paixões, até as discussões contemporâneas, em que pensadores como Harry Frankfurt e Susan Wolf analisam a liberdade em relação à moralidade, o conceito de liberdade se tornou multifacetado. O conceito de agência, essencial para a discussão, relaciona-se diretamente com a capacidade do agente de agir deliberadamente, sendo fundamental para a responsabilidade moral. Ao longo da história, autores como Hobbes e Hume apresentaram visões compatibilistas, buscando conciliar a ideia de liberdade com um mundo determinado, enquanto filósofos como Galen Strawson e Robert Kane, dentro do contexto incompatibilista, defendem a incompatibilidade entre liberdade e determinismo. O presente texto explora essas abordagens, delineando como as teorias da liberdade evoluíram, desde as raízes clássicas até as mais contemporâneas, e como o debate sobre o determinismo continua a influenciar as questões filosóficas atuais. A transformação do conceito de liberdade ao longo da história A liberdade, como conceito filosófico, tem sido tema de debate por milênios e as discussões centram-se na relação entre liberdade, determinismo e responsabilidade moral. Esses diferentes autores, em distintos períodos históricos, ofereceram abordagens únicas sobre o que significa ser livre e como essa liberdade se manifesta em um universo potencialmente determinado. Esta parte apresenta um panorama geral das teorias da liberdade, principais pensadores e obras no percurso da história. 1. Liberdade na Filosofia Antiga Aristóteles, em Ética Nicomaqueia, define a liberdade como a capacidade de o agente agir ou não agir com base em deliberação racional. Ele associa a liberdade ao conceito de “responsabilidade moral”, argumentando que somente as ações realizadas voluntariamente, em oposição às involuntárias, podem ser consideradas livres (ARISTÓTELES, 2009, Livro III). Numa visão estóica, a liberdade verdadeira não depende de condições externas, mas sim do controle interno sobre os desejos e paixões como Epiteto, em seu Manual (Enchiridion), argumenta que a liberdade reside na capacidade de viver em harmonia com a razão e com a ordem natural, rejeitando influências externas. Sêneca, por sua vez, conecta a liberdade à virtude, defendendo que o homem livre é aquele que domina suas paixões (EPICTETO, 2000; SÊNECA, 2004). 2. Liberdade no Contexto Medieval Embora frequentemente associado a debates teológicos, o período medieval desenvolveu teorias profundas sobre a liberdade, especialmente no contexto do livre-arbítrio. Santo Agostinho em seus livros Confissões e De Libero Arbitrio propõe a teoria que a liberdade humana é essencial para a responsabilidade moral e que a verdadeira liberdade consiste em escolher o bem, que está ligado a Deus. Ele enfatiza que o “pecado original” corrompeu a vontade humana – sendo esta uma faculdade ilimitada do homem – tornando-a inclinada ao mal, mas não eliminou sua capacidade de escolha (AGOSTINHO, 2005). Tomás de Aquino, em Suma Teológica, integrou as ideias aristotélicas, Agostinho e teologia cristã, argumentando que a liberdade é a capacidade da vontade racional de se mover em direção ao bem, guiada pela razão divina. Ele também distingue entre liberdade de escolha (libertas arbitri) e liberdade de excelência, esta última relacionada ao aperfeiçoamento moral (AQUINO, 2001). 3. Liberdade no Contexto Moderno Meditações, de René Descartes, introduziu a ideia de liberdade como uma característica essencial da mente. Ele sugere que a liberdade de escolha (liberum arbitrium) é garantida pela capacidade da razão de suspender julgamentos até que a verdade seja clara, vinculando liberdade à racionalidade e ao conhecimento (DESCARTES, 2005). Para Kant, a liberdade é a condição para a moralidade. Ele define em Crítica da Razão Prática a liberdade como a capacidade de agir segundo leis que o agente dá a si mesmo, sendo uma forma de autonomia moral. A liberdade, para Kant, não é a ausência de determinação, mas a conformidade com a razão prática (KANT, 2003). De outro modo, Hobbes defende que liberdade é a ausência de impedimentos externos ao movimento. Ele reconcilia liberdade com determinismo ao argumentar que, mesmo em um universo causalmente determinado, a liberdade persiste se o agente age conforme sua vontade (HOBBES, Leviatã, 1651). Por fim, David Hume em Investigação sobre o Entendimento Humano propõe que a liberdade está em agir de acordo com os desejos do agente, desde que não haja coerção externa, um impedimento. Para ele, liberdade e determinismo coexistem, pois ambos refletem a regularidade causal observada no mundo (HUME, 1748). Essas teorias veremos mais à frente no texto em “Investigação das teorias compatibilistas”. 4. Liberdade Contemporânea Frankfurt define a liberdade em uma estrutura hierárquica dos desejos. A liberdade genuína ocorre quando um agente age de acordo com desejos de primeira ordem que estão alinhados com seus desejos de segunda ordem, volições, dispensando a necessidade de alternativas genuínas (FRANKFURT, 1971). Por outro lado, Wolf conecta liberdade à moralidade, afirmando que ser livre envolve agir conforme desejos que são racionalmente justificados e moralmente bons. Sua abordagem acrescenta uma dimensão ética às discussões sobre compatibilismo, ela parte do princípio que medir responsabilidade moral não é possível sem a esfera